Considerado um "filé mignon", o IVA Único une impostos, mas esbarra em interesses difusos e no complicado federalismo brasileiro
Defendido pela indústria e pelo setor financeiro é considerado o “filé mignon” das propostas já apresentadas, o Imposto de Valor Agregado (IVA) Únido deverá unificar uma gama de tributos federais, estaduais e municipais em uma única alíquota. O novo governo já sinalizou que pretende retomar as discussões sobre uma reforma tributária no próximo ano.
Os parlamentares discutem, no entanto, se seria aplicado o IVA Único ou o Dual – o único unificaria todos os impostos em uma única alíquota e o Dual faria a distinção entre impostos federais e estaduais. “A CNI defende o IVA Único, como alavancador do crescimento econômico no Brasil”, explicou ao Metrópoles o gerente-executivo de economia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Mário Sérgio Telles (imagem em destaque).
Porém, as pretensões da indústria esbarram em muitos atores (governos federal, estadual, municipal; serviços, agro e a população). “São interesses conflitantes que dificultam a reforma”, diz Telles.
“Governos, estados e municípios, cada um briga para arrecadar mais. Tem as empresas, que buscam simplificação para pagar menos e ganhar mais. E há o consumidor, que quer pagar menos”, explicou Jules Queiroz, doutor em direito econômico, financeiro e tributário pela Universidade de São Paulo (USP).
De acordo com Telles, o governo Lula já fez acenos positivos em relação à pauta. “Há manifestações favoráveis internas dentro do governo eleito, como Simone Tebet e o próprio Geraldo Alckmin. Há apoio para a reforma em diferentes níveis, incluindo pessoas dentro do PT e na ala técnica, Pérsio Arida é favorável”, afirma.
“Ela [em referência à reforma tributária] ajudará o Brasil a crescer. Tem efeito na produtividade, simplifica, reduz custos, evita a guerra fiscal”, disse o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB) ao jornal O Globo.
Telles foi questionado se o nome escolhido para o Ministério da Fazenda poderia influenciar o andamento da pauta no Congresso. “Não vejo que o próximo ministro seja um problema para o avanço da reforma tributária, é uma pauta que tem um apoio amplo”, declarou.
A reforma precisa andar no período da “lua de mel” do governo, ou seja, nos primeiros seis meses de 2023, quando há popularidade do presidente eleito e “boa vontade” do Parlamento. Outros governos não conseguiram avançar com a pauta, incluindo o de Bolsonaro. “O governo de Jair Bolsonaro auto sabotou a própria reforma, pois o debate do IVA estava mais maduro e Paulo Guedes insistiu em uma CPMF”, explicou Telles.
Impostos e federalismo
A proposta de emenda à Constituição (PEC) 110/2019, que pretende criar o Imposto de Valor Agregado (IVA), é considerada por especialistas ouvidos pelo Metrópoles o texto mais “maduro”. O projeto segue o modelo francês de tributação – em vigor por lá de 1930 – e que deve desembarcar no Brasil quase 100 anos depois.
O IVA Único substituiria o PIS (Programa de Integração Social), a Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) (PIS/Cofins), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto Sobre Serviços (ISS).”O IVA, diferente do CBS, é o filé da discussão”.
A PEC 110 une todos os tributos da federação, não só os federais, como queria Paulo Guedes [com o CBS]”, explicou Jules Queiroz.
“Uma reforma tributária tem que compreender que é preciso tributar o consumidor, e não a origem, beneficiando o Nordeste e o Norte. Mas isso faria o Sul e o Sudeste perderem muito. Isso tem que ser conversado, implementado de forma gradual, para que a federação seja reequilibrada”, completou Jules.
Há críticas em relação ao popular IVA Único. “Há preocupação com o federalismo brasileiro, em se manter a autonomia administrativa dos Estados e Municípios”, disse o advogado tributarista Bruno Teixeira, sócio do escritório Tozzini Freire Advogados. “O [IVA] Dual se adapta melhor às necessidades do federalismo brasileiro”, observou Jules.
“A reforma tem de levar em consideração as desigualdades regionais […]. Há Estados que dependem de incentivos fiscais para a manutenção de sua atratividade, como a Zona Franca de Manaus”, finalizou Bruno Teixeira.
Fonte: Metrópoles